quarta-feira, 29 de abril de 2009

VITAE

Hoje ele concebera e imprimira seu currículo - esperou quase duas horas numa lojinha que presta serviços tipográficos variados, daquelas que estampam em todos cantos, retratos e paredes frases do tipo "Não diga a Deus que você tem um grande problema. Diga ao problema que você tem um grande Deus". - "O Senhor é meu pastor, nada me faltará" e "Só Jesus salva " são as variáveis. Os proprietários da loja podiam ao menos ser mais criativos, salutou. Ainda gastou a paciência racionada da semana corrigindo erros cadastrais do atendente - cinco vezes, cinco vezes, o cara abusara da sua escassa boa fé. Distribuiria as cópias dos currículos mais tarde - caso o resultado fosse negativo, apelaria para um amigo, aluno de Letras, cara letrado, calejado e pintado em artes. Ele dizia que podia elaborar um currículo "moderno" usando apenas recortes de jornais e colagens de todo tipo. Ele sabia que precisava fazer com que seu currículo se sobressaisse naquela pilha de papéis de escritório. Também podia usar seus contatos - pedir que alguns amigos dessem uma forcinha, cessassem as hostilidades temporariamente, mentisssem positivamente a respeito dele; inventassem qualidades imaginárias, etc - tudo era válido no momento. Ele sabe que seu currículo não é lá grande coisa, mas não é tão ruim, com um pouco de boa vontade alguma empresa podia lhe contratar pelo "conjunto da obra". Ele teve alguns probleminhas com os currículos impressos naquela manhã - muitos amassaram quando foram colocados na mochila. Tentou colocar uns livros em cima, como peso, o resultado não surtiu o efeito desejado: passaria-os com um ferro quente antes de entregá-los.