sábado, 6 de junho de 2009

ITINERANTES

Era cada vez mais emocionante viajar com o serviço de transportes metropolitano paulista - ônibus lotados, figuras incomuns em um meio comum. Sobrava calor, desodorantes vencidos, bêbados, fanfarrões, mulheres obesas, fracassados de todos os tipos e gêneros. Ele procurava coisas singulares nos coletivos. Não era tão fácil. Entretanto, tinha duas oportunidades durante a semana. Na última vez encontrara um sujeito curioso: ele usava um daqueles óculos escuros vendidos a preços módicos em camelôs, trajes de surfista suburbano e o cabelo devidamente desgrenhado com gel sem álcool na fórmula. O cara sentara-se ao seu lado e, enquanto ele olhava para o lado de fora da janela procurando alguma coisa que afastasse o marasmo das pálpebras, o vizinho indesejado parecia hibernar. Logo sentiu algo pesar sobre seu ombro - o cara usava o braço para se apoiar nele! Ele pensou consigo:"se este cara tentar colocar a cabeça no meu ombro darei-lhe uma cotovelada" - reunindo toda força que sua discrição e educação habituais suprimiam. Parece que o estranho ouvira seus pensamentos. Se recompôs em seguida. Ele evitaria se sentar nos assentos de ônibus, mas isto só aumentaria as chances de lhe molestarem sexualmente, imaginava - os ônibus viviam lotados, era mão daqui mão dali, ninguém sabia explicar de onde tantas mãos vinham. Elas desrespeitavam as fronteiras das terras mais baixas, evadiam as estrangeiras, transformavam uma simples viagem numa ferrenha batalha pela integridade sexual.