quarta-feira, 25 de junho de 2008

AMÔRNICA: Contra Chronos.

Yai não superava a vizinha que acordava de manhãzinha para pedir café e açúcar emprestado, com um sorriso no rosto tão verdadeiro quanto uma Mona Lisa de Picasso. A estranha chamava-se Joana e tinha uma aversão inexplicável as consoantes: oiii, ééé, iiii, oooo, uuum compunham a maior parte do seu vocabulário social. Vestia um robe curto, vermelho e insinuante, carregava uma xícara e um jornal nas mãos. Trocava de namorado toda semana – Yai contara. Quando ia para o trabalho, Yai voltava a esbarrar com ela no corredor. Xavier a evitava. Por sorte(claro! Pois nãomelhor definição obviamente) o elevador enguiçava durante a semana inteira. Uma placa indicava:”Elevador em manutenção"– Xavier descia pelas escadas sem olhar para trás - era melhor correr dos riscos. Yai apressada, esbarrava nos outros moradores, desculpava-se com um perdão, despedia-se abruptamente e voltava a apostar corrida com Chronos. Estava no calcanhar dele outra vez. Esgotara seus créditos no último mês. Precisava apressar-se e o Tempo era um trapaceiro. Yai trabalhava numa clínica médica, na seção de radiologia há 9 meses. Era praticamente um serviço voluntário, que o salário mal cobria suas despesas, no entanto fora a melhor opção que encontrara. Não fora difícil escolher, recém-formada, não tinha muitas opções. Ali, 6 meses atrás, conhecera Xavier. A princípio Yai dissera para Xavier que caso ele estivesse à procura de um coração, estava no lugar errado – a seção de cardiologia ficava do outro lado, um pouco mais para a esquerda. Xavier usou cantadas bregas, presentes e pedantismo para convencê-la do que sentia. Yai não achara-o atraente, ria e, como estava sozinha e o rapaz era ao menos engraçadinho, resolveu continuar a história. Uma história repleta de vírgulas, parênteses, reticências e travessões. Ela ainda guardava na gaveta da cômoda, no meio de calcinhas, envelopes, cartas e cartões-postais, a chapa que continha o raio-x do primeiro beijo deles.